O Computador vai substituir o professor?
O diálogo que vou propor nesta coluna é sobre a escola. Acho que precisamos conversar
sobre isso. A Internet está trazendo consigo um novo modelo de educação, uma forma
diferente de aprendizagem, e precisamos entendê-lo, apropriar-nos disso, ser protagonistas
da mudança.
Precisamos conversar principalmente porque a existência dessa grande rede nos faz
pensar na escola que temos, ainda tão fechada, limitada, desconectada do mundo,
da vida do aluno; ainda tão distante da realidade de imagens, sons, cores e palavras
em hipermídia que constitui a nossa vida hoje.
Precisamos conversar sobre nossos sonhos para a escola, pois, se vocês não sabem,
há séculos nós, pedagogos, acumulamos sonhos sobre a sala de aula. Ivan
Illich sonhava com uma educação que não fosse limitada às instituições, que formalizam
tudo. Jean-Jacques Rousseau pensava numa escola que não corrompesse
o homem, deixando simplesmente vir à tona o que temos de melhor. Jean Piaget
queria que os níveis mentais fossem respeitados, sem pular etapas, para que não
tivéssemos que aprender aos saltos, ou decorar o que não entendemos. Freinet sonhava
com uma escola que permitisse o prazer, a aprendizagem agradável e divertida.
Paulo Freire sonhava com um lugar em que o saber do aluno fosse valorizado,onde a relação vivida nas aulas fosse o ponto de partida para uma grande transformação
do mundo. Goleman escreve sobre uma escola que permita desenvolver o
lado emocional, que tenha espaço para as artes, a música, as coisas que, enfim, nos
fazem mais humanos.
Mas não soubemos concretizar muitos desses sonhos. Talvez ainda não tivemos
tempo, porque era preciso primeiro preparar aulas, corrigir provas, anotar no quadro
e nos cadernos tantas e tantas explicações.
De repente a tecnologia entra na escola e nos obriga a recuperar tudo isso. A presença
da máquina leva todo professor a se perguntar: como é a minha aula? Do que
decorre: será que o professor vai ser substituído pelo computador? E sabemos que
a resposta é sim, não temos a menor dúvida.
Explico: é que o pior de nós vai ser substituído.
A nossa pior aula, o lado repetitivo, burocrático e por vezes até acomodado da
escola, esse vamos deixar para o computador. Ele saberá transformar nossas exposições
maçantes em aulas multimídia interativas, em hipertextos fascinantes, em
telas coloridas e interfaces amigáveis preparadas para a construção do saber. Então
poderemos, finalmente, ficar com a melhor parte, aquela para a qual não nos sobrava
tempo, porque pensávamos que devíamos transmitir conhecimentos.
Vamos receber de herança os sonhos de todas as outras gerações, redimi-las realizando
tudo o que não puderam conhecer. Agora sim, está em nossas mãos a derrubada
dos muros para fazer conexões com o mundo, a criação do espaço para a arte
e a poesia, o tempo para o diálogo amigo, o trabalho cooperativo, a discussão coletiva,
a partilha dos sentidos. Está em nossas mãos a construção de uma escola mais
feliz, feita por mestres e alunos que saibam, juntos, propor links e janelas para a sala
de aula, onde aprender não seja uma tarefa árdua e penosa, mas sim uma aventura.
Então será preciso que cada mestre se despeça da figura de professor transmissor
de conteúdos que há em si mesmo, e que os alunos abandonem seu papel de receptores
passivos. Isso é o pior de todos nós, não nos daremos mais a conhecer assim.
Vamos tentar construir juntos algo novo. É claro que nós, professores, vamos precisar deajuda: os alunos saberão nos dizer como fazer. Será que eles aceitam ser nossos mestres?
Acho que sim, é só por este próximo milênio. Nessa nova sala de aula, na verdade
todos serão mestres.
E, curiosamente, a gente vai aprender como nunca.
RAMAL, Andrea Cecília.